quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Instituto Franco-Brasileiro da Biodiversidade: ponto de vista


Gostaria de compartilhar artigo do Professor Marco Antonio Chagas publicado no site do jornalista Correa Neto. É um segundo artigo escrito pelo ilustre cientista sobre o assunto. Vale a pena conferir...

Universidade Livre Franco-Brasileira

A idéia da criação do Instituto Franco-Brasileiro da Biodiversidade não é nova enquanto fruto de uma possível cooperação internacional Amapá-Guiana. Já foi até tema de escola de samba no Amapá, como lembrou outro dia José das Graças, “o Mata”. Mas, vamos acreditar que o “novo” pode significar “fazer diferente”, tanto na concretização de uma promessa política quanto na capacidade técnica de inovação.

A promessa política do Presidente da República passou a ser um desafio e considerando o desembarque no Amapá de grande número de engravatados de Brasília nos últimos dias tudo indica que Lula está determinado a concretizar a promessa e o presidente sabe que nem sempre suas ordens são entendidas como prioridades, ainda mais quando se trata de fazer acontecer alguma coisa na Amazônia, lugar distante dos interesses hegemônicos que dominam a estrutura política e econômica do País.

Há ainda um lado perverso desse processo. A necessidade de criar uma pauta, além da ponte, para o encontro entre Lula e Sarkosy, previsto para o dia 12 de fevereiro no Oiapoque, pode ferir de morte a intenção. Depois nada acontece! Nesse ponto, há que se pautar nos protocolos oficiais do encontro o compromisso mútuo de criação da instituição, seja qual for seu foco de atuação, definindo prazos e responsabilidades entre as partes.

Presenciei no último dia 18 de janeiro na UNIFAP o Secretário Alberto Góes “soltar os cachorros” para cima da turma de Brasília que já ensaiava uma tentativa de imposição de formato institucional para o Instituto ou Université du Biodiversité – Uni-Bió, como propôs o representante do MEC. Isso é um bom começo, pois predomina em Brasília a visão da Amazônia selvagem, o que fortalece apenas a estratégia preservacionista em longo prazo, importante, mas ainda dissociada das necessidades humanas, prementes.

Algumas experiências inovadoras nesse sentido podem ser avaliadas, como a Universidade da Floresta, no Acre, concebida pela equipe técnica do então Governador Jorge Viana e apoiada por um grupo de renomados cientistas e pesquisadores do mundo inteiro, simpatizantes do sócio-ambientalismo.

O Amapá precisa inovar e tenho dúvidas se o Instituto Avançado de Pesquisas da Biodiversidade proposto pelo Governo do Amapá altera em alguma coisa a pauta tradicional e cartesiana das instituições de Ciência & Tecnologia da região. Também não concordo com a escolha do Parque do Tumucumaque como unidade de conservação prioritária a ser implantada, pois o ecoturismo como atividade econômica em áreas de floresta e circundada por cidades precárias em infra-estrutura é questionável.

A considerar a boa condição de preservação das áreas protegidas do Amapá e a ausência de ameaças imediatas a biodiversidade, me parece que uma alternativa a ser discutida é o aproveitamento econômico das florestas estaduais para geração de emprego e renda. Nesse ponto, o Governo do Amapá transformou 2,0 milhões de hectares de florestas em áreas destinadas ao manejo e seria uma questão de coerência colocar em prática o discurso da sustentabilidade, comprovando que é possível crescer a economia com responsabilidade ambiental.

As florestas do Amapá têm potencial para os seguintes negócios: madeira sólida, madeira energética, produtos não madeireiros (cipós, óleos, resinas, etc.), além de serviços ambientais. Cálculos estimados, considerando uma área de 2,0 milhões de hectares de florestas manejadas, dão a dimensão do que poderíamos considerar “o bom negócio da sustentabilidade no Amapá”: a) Faturamento de R$ 700 milhões/ano; b) Geração de 5.000 empregos diretos e 50.000 indiretos; c) Impostos da ordem de R$ 200 milhões/ano; d) Madeira energética pode gerar 103,8 MW, o que representa quase a metade de toda energia gerada atualmente no Amapá.
Defendo a tese de que a única forma de salvar a Amazônia é saber explorá-la. O manejo sustentável das florestas é, na minha modesta opinião, um dos melhores instrumentos econômicos de gestão dos recursos naturais na Amazônia e poderia integrar uma das linhas de pesquisas de uma nova instituição que se insinua inovadora.

Não sei se a proposta do Amapá a ser apresentada no encontro Lula-Sarkosy é criar um Instituto, uma Universidade ou qualquer outra instituição voltada para estudos e pesquisas na região do Platô das Guianas. Entretanto, considerando que há sinais de vida inteligente na região, o mérito político estará na capacidade de construir uma proposta ousada e inovadora capaz de produzir pesquisas ajustadas às necessidades regionais e aberta a diversidade de saberes para além do conhecimento científico tradicional.

Marco Antonio Chagas, doutorando UNIFAP/UFPA-NAEA (marco.chagas@uol.com.br)
(Foto: Luciana Capiberibe-Blog Notícias Daqui)

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